Por José Marcos C. Brito

Na Era do Conhecimento ou Era Digital, a capacidade de gerar, compartilhar, e acessar informação é fundamental para o desenvolvimento social e econômico das pessoas, empresas e nações. Ao longo dos últimos anos, novas aplicações foram surgindo, resultando em um crescimento exponencial no tráfego de dados, tanto nas redes fixas quanto nas redes de comunicações móveis. Ao final de 2020, o tráfego global gerado nas redes de comunicações móveis já ultrapassava o estratosférico valor de 90 Exabytes por mês. As redes de comunicações móveis de 5ª geração (5G), que já começaram a ser implantadas em várias partes do mundo e que devem começar a ser instaladas de forma massiva no Brasil em 2022, prometem acelerar ainda mais o crescimento do tráfego de dados, criando demandas expressivas por capacidade de conectividade. Nas redes 5G, além das pessoas, haverá a conexão de um enorme número de dispositivos de Internet das Coisas (algumas projeções falam em trilhões de dispositivos), criando um ecossistema de alta complexidade. O novos cenários de uso do 5G trazem uma enorme gama de novas aplicações que prometem revolucionar os mais diversos setores da economia e da sociedade (denominadas verticais de mercado), como aplicações de realidade virtual e realidade aumentada, robôs e drones colaborativos, diagnósticos e intervenções médicas remotas, cirurgias remotas, veículos autônomos, jogos imersivos em tempo real, aplicações de Internet tátil, dentre muitas outras. No entanto, para que todo o potencial das redes 5G tenha, de fato, o impacto positivo previsto nas diversas verticais de mercado, conectividade em larga escala, confiável, e com grande capacidade, é uma questão chave.

Adicionalmente, as pesquisas para a definição das redes de comunicações móveis de 6ª geração (6G) já iniciaram. A previsão é que estas redes, que devem estar disponíveis comercialmente em 2030, criem uma revolução ainda maior do que as redes 5G. Para o 6G vislumbra-se que haverá uma integração entre os mundos físico, digital e biológico, com a criação do conceito de gêmeos digitais, em que haverá uma réplica exata do mundo físico representada, em tempo real, em um mundo virtual digital. As aplicações que poderão advir deste novo cenário são inimagináveis e demandarão uma capacidade de escoamento de tráfego de dados ainda maior por parte das redes de telecomunicações.

O grande potencial de aumento de competitividade e produtividade associado às redes 5G e às futuras redes 6G traz à tona uma questão social de extrema relevância. A falta de acesso à informação não é mais aceitável nos dias atuais, pois ela resultaria em uma divisão digital ainda maior do que a já existente. O impacto na vida das pessoas da falta de acesso a soluções de conectividade, já amplamente conhecido, ficou ainda mais evidente com a pandemia do Covid-19. Assim, é preciso garantir conectividade ampla e irrestrita a todos, facilitando o processo de transformação digital e de inclusão digital e contribuindo para o estabelecimento de uma sociedade mais justa e igualitária.

No contexto apresentado acima, a inauguração do cabo óptico transatlântico EllaLink, conectando o Brasil a Portugal, em 1º de junho de 2021 (https://leading-the-digital-decade.eu), é uma notícia auspiciosa. O cabo de 6.000 km de extensão poderá ofertar, após sua completa operacionalização, uma taxa de 72 Tbps. O lançamento deste cabo é parte do programa BELLA (Building Europe Link to Latin America – www.bella-programme.eu), que visa prover suporte para a conectividade de longo prazo entre as comunidades de educação e pesquisa da América Latina e da União Europeia. Pela primeira vez haverá uma conexão direta segura e de altíssima capacidade de transmissão entre as duas regiões. O principal objetivo do programa é auxiliar na transformação do processo de colaboração entre entidades Europeias e Latino-Americanas nas áreas da educação e da pesquisa. Mais de 65 milhões de usuários de 12.000 instituições na América Latina e na Europa serão beneficiados por este programa.

O programa BELLA é resultado de um contínuo esforço de cooperação internacional envolvendo governos, instituições públicas e empresas da União Europeia e dos países da América Latina participantes. A viabilidade econômica do programa ocorreu por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP) envolvendo instituições e governos dos dois lados do Atlântico. A União Europeia aportou E$ 26,5 milhões para o programa, que foram complementados com recursos da Latin American National Research and Education Networks (NRENs) e do governo Brasileiro.

Os benefícios que o cabo EllaLink trará para as comunidades acadêmicas participantes do programa BELLA são enormes, alavancando negócios, inovação e trocas de experiências culturais e acadêmicas entre os dois continentes. Uma solução de conectividade de altas capacidade e confiabilidade e baixa latência (a latência da conectividade entre Brasil e Portugal se reduzirá em 50% com o uso do cabo, alcançando um valor aproximado de 60 ms) potencializa a cooperação em áreas estratégicas, como aquelas que envolvem computação de alto desempenho, inteligência artificial, big data, redes 5G e 6G, cloud computing, telemedicina, monitoramento de pandemias e monitoramento de dados da Terra (monitoramento da atmosfera, do clima, do meio-ambiente e dos mares). A menor latência da conexão também viabiliza a execução de algoritmos cooperativos em ambas regiões para soluções de problemas com requisitos de resposta em tempo real.

Os benefícios para as comunidades acadêmicas do Brasil e da Europa trazidos pelo cabo EllaLink ficam ainda mais evidentes no cenário de pandemia do Covid-19. Nos anos de 2020 e 2021 praticamente todas as milhares de conferências, congressos e simpósios acadêmicos do mundo migraram para um modelo on-line, em que a boa condução dos trabalhos demanda conectividade de alta capacidade, alta confiabilidade e baixa latência. Além disto, vários projetos cooperativos de pesquisa entre instituições acadêmicas brasileiras e europeias foram afetados pela impossibilidade da realização de viagens, que inviabilizaram a realização de reuniões presenciais e a execução de experimentos com a participação simultânea de pesquisadores de ambos os lados; neste caso,  soluções de conectividade de alto desempenho não só permitem a realização de reuniões virtuais de melhor qualidade como a virtualização de equipamentos de laboratórios e de soluções computacionais para a realização de ensaios remotos, minimizando os efeitos negativos da pandemia nos resultados das pesquisas.

Em conclusão, o cabo EllaLink permitirá aprofundar iniciativas de cooperação entre a América Latina e a Europa, facilitando a troca de informações e de experiências entre instituições dos dois continentes, contribuindo assim para a aproximação política, econômica, acadêmica, cultural e social entre a Europa e a América Latina. Este novo cenário de cooperação contribuirá não só para o desenvolvimento econômico, mas também para o desenvolvimento social, colaborando com o processo de transformação digital e com uma maior inclusão digital nas duas regiões.

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