Por: Werter Padilha*

Para mim, é sempre uma grande satisfação relembrar o período no qual participei como advisor no Conselho Consultivo que elaborou o projeto-estudo “Internet das coisas: um plano de ação para o Brasil”, iniciado em 2016 pelo MCTI e BNDES. Não me recordo de nenhum trabalho tão bem-feito e com tantas mãos atuantes: centenas de experts do Brasil e dezenas internacionais, centros de pesquisas, universidades, representantes de classe técnica e patronal de nossa sociedade, parlamentares, entre outros. O resultado culminou no Plano Nacional de Internet das Coisas (PNIoT), Decreto nº 9.854, de 25 de junho de 2019, com a finalidade de implementar e desenvolver a Internet das Coisas no Brasil.

Saúde, Cidades Inteligentes, Indústria e Rural foram as 4 verticais priorizadas. Mais recentemente, a vertical Turismo foi também incluída no PNIoT, em função do impacto da pandemia nas atividades turísticas, a necessidade de promover a transformação digital nesta área e a disponibilização de destinos inteligentes no país.

Cada uma destas verticais começou a ser tratada ao estilo “hands on” em Câmaras 4.0, em Brasília. Os Ministérios da Saúde, Economia, Agricultura e Turismo começaram a tocar as estratégias, políticas públicas, gerar sinergias e fontes de fomentos para fazer o IoT acontecer no Brasil.

Todas as Câmaras, sempre com a participação do MCTI na moderação, têm sido fóruns muito relevantes, porque propiciam a integração da academia, de institutos de ciência e tecnologia (ICTs), entidades que representam diferentes setores econômicos e os demais atores do cenário da inovação e empreendedorismo.  E nem a pandemia afetou a condução dos trabalhos das câmaras, pois todos continuaram engajados, mesmo que se reunindo virtualmente.

As Câmaras 4.0 destas verticais do PNIoT têm apresentado seus resultados e planos de ação. É um processo retroalimentado, já que sinergias têm sido criadas e planos de ações e investimentos têm sido gerados e aperfeiçoados nestes encontros. Claro que gostaríamos que os resultados fossem mais expoentes em alguns casos, mas sou testemunha de que, apesar dos obstáculos, bons e firmes passos foram e continuarão sendo dados.

Reitero que na pandemia os incentivos não pararam. BNDES, ABDI, Embrapii, Finep e Softex, só para citar alguns nomes, implementarem diferentes linhas de investimentos e editais para projetos de IoT.

Desde o dia 1º de janeiro de 2021, dispositivos de Internet das Coisas (IoT) e para sistemas de comunicação máquina a máquina (M2M) ficaram isentos de pagamento de Fistel, de Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública (CFRP) e de Condecine pelo prazo de cinco anos. Ou seja, é vital aproveitarmos este incentivo dentro de sua validade.

Outra boa notícia foi o novo fôlego dado ao Padis (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores).   O susto foi grande, pois sua renovação ocorreu, como dizem, “aos 40 minutos do 2º tempo”. O que importa, entretanto é que a Lei 14.302/22 foi promulgada e prorroga os incentivos do Padis até 2026.

Destaco também o “gol de placa” representado pelo sucesso do Leilão do 5G, ocorrido em novembro de 2021, que viabilizará a “autoestrada de alta velocidade” pela qual a Internet das Coisas deverá deslanchar.  Ansioso em começar a ver os primeiros resultados já compromissados para 2022.

E vale deixar registrado que temos o recente edital da FINEP/MCTI, que acabou de sair do forno, e vai selecionar projetos de inovação em Inteligência Artificial (IA), desenvolvidos por startups nas verticais já citadas do PNIoT. Ao todo, serão R$ 80 milhões em recursos de subvenção econômica.

Assim, afirmo que o Brasil está acontecendo! Pelo segundo ano consecutivo, registrou-se um recorde no total aportado em startups, por meio de 779 transações. Segundo levantamento da plataforma Distrito, as startups brasileiras receberam um total de US$ 9,4 bilhões em investimentos em 2021, sendo que este valor é 2,5 vezes maior que o investido em 2020, e o maior desde o início do estudo, em 2011. O Brasil, que em 2018 possuía apenas um unicórnio, atualmente, já contabiliza 16 deles, segundo dados de fevereiro de 2022 da StartupBase.

Relevante também destacar que neste cenário, várias Venture Capital foram criadas no Brasil nos últimos 3 anos, e estão direcionando suas teses de investimentos cada vez mais para inovação e tecnologias disruptivas. Como dizem, “tem dinheiro na mesa para bons projetos”!

Como exemplo, cito a iniciativa entre BNDES e Qualcomm Ventures LLC que aportaram R$40 milhões cada uma no Fundo IoT.  Neste projeto, a Indicator Capital foi selecionada como gestora e o Fundo Indicator 2 IoT FIP tem agora valor captado de R$ 240 milhões, focado em investimentos early stage, sendo o primeiro especializado em Internet das Coisas (IoT) e Conectividade na América Latina.

Podemos afirmar que nunca o país teve tantos investimentos e fundos apostando em inovações tecnológicas baseadas em IA, IoT, 5G, entre outras. Essa entrada de capital aumenta as chances de as startups escalarem e atraírem mais investimentos.

Está tudo um “mar de rosas”? Não! Mas, o fato é que os problemas estarão presentes em qualquer cenário!  Existiram problemas no passado e existem hoje. Por isso, é necessário colocarmos em campo nossa resiliência, perseverança, flexibilidade. Juntemos criatividade, agilidade para inovar e tracionar na receita de sucesso. Infelizmente estamos vivenciando o conflito entre Rússia e Ucrânia e suas farpas também nos atingem; a inflação é um ponto crítico, pois aumentou no Brasil e no mundo; e, especificamente na conjuntura brasileira, falta pouco mais de 6 meses para as nossas eleições em 2022, um fator que costuma desestabilizar.

Há outra questão-chave, que é como o Brasil vai responder à crise mundial de chips, que combina alta demanda e escassez de dispositivos, o que leva a um aumento de preços e longos prazos de entrega.  A dificuldade é global, mas creio que há algumas alternativas para exercermos nossa resiliência com criatividade.  A renovação do Padis foi um excelente sinal. Por outro lado, o TCU suspendeu o processo por meio do qual o governo federal planeja fechar a Ceitec, a única fábrica de chips da região.

Em meio a este imbróglio, ocorreu um outro processo no qual a Softex foi a única a apresentar proposta ao chamamento público para celebrar Contrato de Gestão cujo objeto seja a pesquisa, o desenvolvimento, a extensão tecnológica, a formação de recursos humanos e a geração e promoção de empreendimentos de base tecnológica em semicondutores, microeletrônica e áreas correlatas. Como isso ocorrerá? Ainda não se sabe. O ministro Marcos Pontes, do MCTI, declarou durante evento em Barcelona, que o país terá um novo programa de semicondutores. Aguardamos que essas definições sejam divulgadas brevemente.

Diante dessa conjuntura, espero que o Brasil não se perca em debates jurídicos e deixe passar a oportunidade de termos alguma posição respeitável neste tabuleiro do mercado mundial de semicondutores.   Afinal, o mundo está refém da produção asiática, lembrando que Taiwan e China respondem por cerca de 70% dos chips que o mundo consome e aqui é outra situação geopolítica que exige nossa atenção.

Para encerrar esta análise, apesar das previsões, o PIB brasileiro cresceu 4,6% em 2021 e superou as perdas provocadas em 2020 como efeitos da Covid-19. O crescimento do ano passado foi puxado pela indústria e serviços. Então, digo que é hora de valorizar os nossos pontos fortes: a capacidade dos nossos talentos empreendedores, a qualidade dos ICTs, o tamanho do mercado interno e a vontade de fazer acontecer. Podemos superar os desafios e construir um futuro promissor, um Brasil Mais Digital e Menos Desigual, no qual a IoT certamente já é uma das viabilizadoras das transformações positivas que almejamos.

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*CEO da Taggen e Conselheiro da ABES

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