Apresentada durante evento na Câmara dos Deputados, organizado em maio pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, o Projeto Glória é uma plataforma de inteligência artificial voltada para o combate à violência contra a mulher, idealizada pela professora Cristina Castro-Lucas, da Universidade de Brasília (UNB).

Cristina conseguiu reunir empresas das áreas social e de tecnologia para se associarem, criando a robô Glória, que vai operar por meio de interfaces inteligentes e de autoaprendizagem a partir de um conjunto de algoritmos capazes de evoluir com interações em linguagem natural com o usuário.

Ao todo, cinco instituições que estão contribuindo, inicialmente, com o projeto: a Ink Inspira, de Gestão e Avaliação de Projetos Sociais; a Seedin, start up de desenvolvimento de projetos de inteligência artificial; a Qubo, empresa especialista em análise de dados; BlockForce, de modelagem e implementação de blockchain; e a Free Free, plataforma de apoio a mulheres vítimas de violência. A previsão é de que mais de 20 milhões de pessoas sejam beneficiadas pela Glória a longo prazo.

Por meio de experiências de interação com uso de inteligência artificial, os usuários poderão vivenciar comportamentos e atitudes de uma pessoa real ao acessar a plataforma. A robô Glória entenderá os fatos abordados e identificará soluções para a quebra do ciclo de violência contra mulheres e meninas.

“É muito importante ressaltar que a Glória não substitui a denúncia às forças policias nem o comparecimento aos postos de saúde no caso de violência física e sexual de qualquer tipo. O registro da ocorrência, seja através de um boletim de ocorrência, seja nos formulários do SUS, continua imprescindível para o efetivo combate à violência contra mulheres e meninas”, explica Cristina.

Aprendizado da Glória nas interações

A professora informa que a Glória tem duas funções centrais: acolher e educar. “A função educadora é a responsável por apresentar conteúdo informativo sobre a violência contra mulheres e meninas. Numa interação com a Glória, é possível apenas perguntar sobre violência e obter respostas como estatísticas por local, idade, tipo de violência, dados regionais, nacionais e mundiais, entre outros”, esclarece. Já “a função acolhedora é a responsável pela recepção dos relatos e coleta de todas as informações que forem compartilhadas espontaneamente. A Glória escuta sem fazer julgamentos e provê, na medida do possível, um certo senso de pertencimento, de não sentir-se só, de cumplicidade”, completa.

Quanto mais relatos, maior será a capacidade da Glória de identificar similaridades, relacionar ocorrências e – num futuro visionário – antecipar potenciais desdobramentos. “Neste sentido, a função educadora da Glória será atualizada permanentemente, ajudando mulheres a conhecerem mais sobre a violência que as atinge. Já a função acolhedora assimilará os pontos centrais do relato, ligando aquela situação a outras e, futuramente, conectando a vítima com entidades de proteção social, como polícia, abrigos, ambulâncias, entre outros órgãos”, prevê Cristina.

Após a apresentação do robô oficialmente em Brasília, a Glória tem feito pequenas aparições em ambientes controlados, seja para o teste de sua interface, seja para realizar as primeiras coletas de dados a partir de relatos espontâneos. “São feiras, conferências, festas, festivais onde a Glória está recebendo treinamento.

Em tempo nos quais estar na internet é também ter contato com “trolls”, Glória terá mecanismos para saber se está interagindo em uma conversa séria. Cristina esclarece que há pelo menos duas formas de identificar relatos fora do contexto da violência contra mulheres e meninas. “O primeiro diz respeito aos algoritmos de aprendizado supervisionado sobre os quais as interações da Glória ocorrerão. As primeiras interações serão controladas e formarão a base de dados inicial. Novos incrementos ocorrerão a cada nova interação, que por sua vez serão analisadas em comparação com os relatos pré-existentes. Em grandes volumes, é possível identificar o que está fora de contexto e sem relação com nada do que surgiu antes. Não descartaremos o inédito, mas será possível rapidamente identificá-lo e avaliar sua validade”, detalha.

A segunda forma de desviar a Glória de “trolls” estará relacionada aos modelos matemáticos que sustentarão a criação dos mapas de palavras e contextos a partir dos relatos obtidos. “Com o crescimento do número de relatos é muito provável a repetição de termos, expressões, gírias, assim como do encadeamento dos relatos. Não é impossível que aconteça, mas será cada vez mais difícil contar uma história inverossímil e desconectada dos contextos reais da violência sem ser percebido, numa tentativa de comprometer as funções da Glória”, analisa.

De acordo com os Relógios da Violência, desenvolvido pelo Instituto Maria da Penha, uma mulher é vítima de violência física ou verbal a cada 2 segundos no Brasil. A maior parte dos casos é reincidência.

Foram registradas 221.238 denúncias de violência doméstica em 2017. Mais de 606 casos por dia. Os estupros tiveram um crescimento de 10,1% de 2016 para 2017. Ao todo, 61.032 casos foram denunciados. Mortes consideradas feminicídio somaram 1.133 casos.

O projeto tem um perfil nas redes sociais Instagram, YouTube, FacebookTwitter, além de um site no endereço www.eusouaGlória.com.br.

Compartilhe