Fonte: Itforum
Por Natália Marroni Borges*
Ferramentas de gestão desempenham um papel importante na formulação e acompanhamento de estratégias empresariais
A inteligência artificial (IA) está rapidamente se consolidando como uma das principais tecnologias transformadoras da atualidade, gerando impactos em múltiplos setores e diferentes unidades organizacionais. Sua transversalidade permite que seja aplicada em diversas áreas, e sua capacidade de alterar fundamentalmente processos, gerar novos modelos de negócios e aprimorar a eficiência operacional eleva a tecnologia a um patamar distinto. Isso torna necessário (e, por que não, imprescindível) que as empresas considerem a IA em suas estratégias. Nesse contexto, as ferramentas de gestão baseadas em OKRs (Objectives and Key Results) e KRs (Key Results) desempenham um papel importante na formulação e acompanhamento de estratégias empresariais.
Os OKRs têm sido amplamente utilizados por grandes empresas como Google, Intel e Microsoft para alinhar esforços em direção a metas de longo prazo, enquanto os KRs fornecem métricas tangíveis que indicam o progresso em direção a esses objetivos. Neste texto, exploraremos alguns caminhos sobre como o potencial da IA pode ser integrado ao processo de definição de OKRs e KRs, proporcionando aos executivos uma visão mais clara de como essa tecnologia pode se tornar um catalisador para o sucesso organizacional e uma vantagem competitiva no mercado.
OKRs (Objectives and Key Results) são uma metodologia usada para definir e acompanhar metas dentro de uma organização. Um OKR é composto por dois elementos: o objetivo, que é uma declaração qualitativa do que a empresa deseja alcançar, e os KRs, que são resultados-chave mensuráveis que indicam o progresso da empresa rumo a esse objetivo. Cada objetivo deve ter entre 2 a 5 KRs, e os resultados são mensurados regularmente, geralmente em ciclos trimestrais. Essa metodologia permite que as empresas alinhem suas iniciativas em diferentes níveis, desde as estratégias de alto nível até as operações diárias. Por exemplo, uma empresa pode estabelecer como OKR “Aumentar a satisfação do cliente”, com KRs relacionados a métricas específicas, como o aumento do Net Promoter Score (NPS) ou a redução no tempo de resposta. A operacionalização dos OKRs depende de uma dinâmica de revisão frequente e transparente. O progresso dos KRs é medido ao longo do tempo, e ajustes podem ser feitos conforme necessário. Esse sistema é amplamente adotado por organizações que buscam foco, alinhamento e transparência em seus objetivos. Contudo, em um contexto onde novas tecnologias, como a IA, começam a impactar os resultados esperados, há uma necessidade latente de repensar e revisar essas métricas para que reflitam, também, o novo cenário.
Nesse sentido, o entendimento é de que o potencial transformador da IA não pode ser ignorado pelas empresas. As organizações que falham em considerar como essa tecnologia pode influenciar seus OKRs e KRs correm o risco de perder competitividade. Não se trata apenas de uma questão de otimização tecnológica, mas sim de uma transformação estratégica. A IA é capaz de melhorar drasticamente a eficiência operacional, a análise de dados e até mesmo a personalização de serviços, com potencial tremendo de impactar diretamente os resultados da empresa. Portanto, espera-se mais do que a simples adição de tecnologia ao mix operacional, já que o potencial da IA é de transformar o modo como os objetivos são atingidos ou, até mesmo, como são formulados.
Por isso, a introdução da IA nos OKRs é tão importante e pode assumir várias formas, dependendo do nível de maturidade da empresa com a tecnologia. Os executivos devem assumir o papel de identificar onde a IA pode agregar valor. Isso pode significar estabelecer OKRs específicos focados em iniciativas de IA ou avaliar como a IA pode influenciar os KRs já existentes. Negligenciar essa análise pode resultar em perdas significativas de oportunidades, enquanto a empresa se mantém estagnada em um mercado cada vez mais competitivo. Em grandes empresas como Amazon e IBM, a IA já está sendo usada para redefinir objetivos estratégicos, mostrando que essa tecnologia deve estar no centro da estratégia corporativa.
Uma das maneiras mais diretas de incorporar IA na estratégia organizacional é definindo OKRs específicos para a IA. Executivos podem criar objetivos focados na implementação ou expansão da IA dentro da empresa. Esses OKRs podem incluir metas de automação, redução de custos ou mesmo a criação de novos produtos baseados em IA. Por exemplo, um objetivo pode ser “Liderar a inovação com IA no setor”, com KRs como “Implementar IA em 5 processos-chave até o final do ano” ou “Reduzir custos operacionais em 15% por meio de automação com IA”. Ao decidir por estabelecer OKRs voltados diretamente para a adoção da IA, a organização coloca a tecnologia como uma prioridade estratégica, garantindo que recursos e esforços sejam alocados para impulsionar o uso e a geração de valor da tecnologia.
Essa abordagem tem efeitos práticos significativos: ao focar em OKRs específicos para IA, a empresa passa a ser intencional em seu caminho de adoção da tecnologia. E a adoção de IA não se limita à instalação de novas ferramentas tecnológicas; ela exige a capacitação da equipe, o ajuste de processos e, muitas vezes, mudanças culturais significativas dentro da organização. Desafios como a necessidade de novos talentos especializados, mudanças culturais e riscos associados à implementação de tecnologias emergentes devem estar no radar. Dessa forma, os executivos que escolhem essa abordagem precisam avaliar se a estrutura organizacional está pronta para garantir o alinhamento entre os departamentos de TI, operações e negócios, de modo a maximizar o impacto da IA nos resultados.
Outra abordagem que pode ajudar na aproximação entre os temas de IA e estratégia organizacional é revisitar os OKRs já existentes, identificando quais KRs podem ser diretamente influenciados pela IA. Nesse caso, a empresa não cria novos OKRs, mas analisa de que maneira a IA pode otimizar ou transformar os resultados-chave estabelecidos. Por exemplo, um KR relacionado ao tempo de resposta ao cliente pode ser diretamente afetado pela implementação de IA generativa em chatbots, reduzindo significativamente o tempo de espera e melhorando a satisfação do cliente.
Idealmente, os executivos devem conduzir esse exercício de forma intencional e estratégica, mapeando os KRs influenciados e, a partir disso, tomando decisões sobre como a IA pode ser integrada de maneira mais eficaz, a depender do tamanho da influência da tecnologia nos KRs da organização. Esse processo envolve a criação de um plano de ação para a implementação de IA nos processos mapeados, seguido de uma reavaliação periódica dos resultados, para garantir que a tecnologia esteja, de fato, impactando positivamente os KRs. Uma das vantagens dessa abordagem específica é que ela possibilita uma integração mais gradual da IA, mitigando riscos e possibilitando ações já orientadas por um ROI mais previsível.
O papel dos executivos na incorporação da IA à estratégia organizacional é indiscutível e necessário. Eles são os responsáveis por, inicialmente, reconhecer e, em seguida, garantir que a IA seja vista não somente como uma ferramenta tecnológica, mas como um elemento-chave para o sucesso estratégico da empresa. As decisões sobre como a IA pode transformar os resultados de negócios precisam ser baseadas em uma análise cuidadosa e deliberada, e não podem ser deixadas ao acaso.
Nesse sentido, adotar uma postura ativa na definição de OKRs voltados para IA ou avaliar o impacto da tecnologia nos KRs existentes são abordagens que colaboram para deixar a organização estrategicamente preparada para capitalizar as oportunidades trazidas pela IA. De qualquer forma, cabe salientar que cada uma dessas abordagens requer compromisso em termos de alocação de recursos e mudanças organizacionais, para garantir que a tecnologia entregue o impacto esperado. A responsabilidade dos executivos é garantir que esse processo seja contínuo e dinâmico, ajustando a estratégia conforme necessário para que a IA seja realmente um diferencial competitivo.
Além disso, uma reflexão consciente sobre o papel da IA na estratégia pode evitar que a empresa reaja de forma passiva às transformações tecnológicas. A adoção proativa de IA, alinhada aos objetivos estratégicos, não apenas tende a melhorar a competitividade da organização, mas também cria uma base sólida para inovação contínua.
Por fim, à medida que as empresas avançam na adoção de IA, a clareza sobre o impacto potencial da tecnologia e a geração de valor nas metas de negócios devem ser mantidas no centro das decisões estratégicas. O sucesso dessa abordagem depende, em parte, da capacidade dos líderes em identificar, avaliar e alinhar as oportunidades que a IA oferece com os OKRs da empresa, criando uma sinergia que garante mais do que sobrevivência: o crescimento contínuo em um mundo impulsionado, também, pela IA.
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*Pesquisadora no Think Tank da ABES, Pesquisadora membro do grupo IEA Future Lab (vinculado à Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS), Pós-doutoranda em Inteligência Artificial e Foresight e professora na UFRGS. As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, os posicionamentos da Associação.