Por Paulo Milliet Roque, Vice-Presidente e Diretor de Inovação da ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software

Paulo Milliet Roque, Vice-Presidente e Diretor de Inovação da ABES (Associação Brasileira das Empresas de Software)Os casos de bloqueio do serviço de mensagens instantâneas WhatsApp e mesmo a prisão do executivo do Facebook no Brasil neste ano trouxeram, mais uma vez, à tona uma questão pertinente à sociedade atual que parece estar longe de se chegar a um consenso: segurança x privacidade. Por um lado, temos as empresas de tecnologia que têm como parte fundamental do seu serviço garantir a privacidade de seus usuários e do outro as leis que regem o país destes mesmos cidadãos. E ainda entre estas duas forças, a sociedade que precisa se sentir segura ao utilizar as ferramentas digitais e ao mesmo tempo não quer que crimes deixem de ser solucionados ou que criminosos fiquem impunes por conta da falta de acesso à informação das autoridades policiais.

O legislador brasileiro precisa ficar atento, porém, para que as regras a respeito da proteção de dados, sigilo e privacidade do usuário não se traduza em obstáculo intransponível para que empresas possam oferecer uma série de serviços inovadores – de interesse desses mesmos usuários – cuja realização envolve tratamento e transferência de dados e metadados.

No Brasil, existem leis que tratam do assunto, dentre as quais o principal instrumento legal, o Marco Civil da Internet, amplamente debatido e considerado um grande avanço no mundo todo sobre este tema. No caso atual, em seu artigo 15, exige que um provedor de aplicações mantenha os respectivos registros de acesso (não o conteúdo) em aplicações de internet por seis meses.

As dúvidas, no entanto, se acirraram nos últimos meses. A punição empregada ao executivo do Facebook pode ser considerada justa? Até onde pode-se dizer que a empresa não respondeu à Justiça adequadamente? Os players de tecnologia internacionais ou não estão corretos em disponibilizar ao mercado serviços que implicam na transferência ou tratamento de dados, negando-se, porém, a revelar esses dados às autoridades dos países em que atuam?

Dentre os principais motivos que as empresas alegam para não mudar seus sistemas (e isso é realmente preocupante) destacam-se o dever de proteger os dados, o sigilo e privacidade dos usuários desses aplicativos e a garantia de que as informações privadas não sejam usadas por governos com regimes extremistas, que muitas vezes não respeitam os direitos humanos, por exemplo. Se a cessão das informações ocorrer em algum país, a empresa pode abrir precedentes para outras regiões exigirem o mesmo.

O Whatapp encontrou uma solução técnica para resolver esse problema legal, em vários países.  Criptografa todas as mensagens e não as armazena em seus servidores. As mensagens só estão disponíveis no smartphone do usuário.

A criação de backdoors para uso das autoridades – que era a ideia do governo americano – foi descartada, pois cibercriminosos poderiam se aproveitar dessas mesmas portas para invadirem a privacidade e os dados dos usuários.

As facilidades e o conforto pessoal criadas pelo Whatsapp, pelo Google, pelo Waze, e outros têm como contrapartida uma certa perda de privacidade. Os usuários é que devem decidir quanto da sua privacidade estão dispostos a ceder para conseguir essas facilidades.

Engajada em abrir um fórum para discussões sobre uso, compartilhamento e proteção de dados, a ABES lançou o portal Brasil, País Digital www.brasilpaisdigital.com.br, focado em informações sobre as leis de proteção de dados, com notícias e casos ligados ao assunto no Brasil e mundo. A entidade ainda atua com um Comitê sobre o Marco Regulatório, que se ocupa de temas relacionados com a internet e reúne vários executivos do setor para debater situações como essas.

Essa foi uma forma encontrada pela ABES para manter tanto as empresas quanto a sociedade atualizadas quanto ao desenrolar de casos como os que as empresas em geral e o Facebook, Whatsapp e Google, entre outras, vêm enfrentando.

O momento agora requer um debate com a participação de especialistas em direito, empresas do setor, especialistas em TI e sociedade civil para que se chegue a um consenso onde a internet seja um agregador para a evolução e a inovação, e não um instrumento de litígios e espaço seguro para o crime.

Compartilhe